Empresários foram alvos de busca e apreensão da PF, após autorização do ministro do STF Alexandre de Moraes. Supremo também determinou quebras de sigilo fiscal.
Cinco empresários são citados pelo Supremo Tribunal Federal (STF) como financiadores de um suposto esquema de impulsionamento de informações falsas e ataques às instituições. Ao todo, 17 pessoas são investigadas no inquérito.
Nesta quarta (27), o ministro Alexandre de Moraes determinou que a Polícia Federal cumprisse mandados de busca e apreensão contra os alvos, incluindo os cinco supostos financiadores. Além deles, a lista inclui blogueiros e influenciadores digitais que apoiam o presidente Jair Bolsonaro.
“Toda essa estrutura, aparentemente, está sendo financiada por um grupo de empresários que, conforme os indícios constantes dos autos, atuaria de maneira velada fornecendo recursos (das mais variadas formas), para os integrantes dessa organização”, afirma Alexandre de Moraes no inquérito.
O ministro também pediu a quebra dos sigilos fiscal e bancário de quatro dos cinco empresários. A lista de financiadores, segundo o STF, é formada por:
- Edgard Gomes Corona
Edgard Corona, dono da Smartfit, alvo de operação da PF contra fake news — Foto: Grupo Bio Ritmo/Divulgação
Edgard Corona é fundador e presidente do grupo Bio Ritmo, que engloba as redes de academia Bio Ritmo e Smart Fit. Até o começo do ano, Corona fazia parte de um grupo de empresários chamado “Brasil 200 Empresarial”.
Em fevereiro, ele enviou aos colegas, em um aplicativo de mensagens, diversas imagens com críticas e ofensas ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Além das mídias, Edgard Corona escreveu: “Temos de impulsionar esses vídeos. Precisamos de dinheiro para incestir [investir] em mkt [marketing]”.
As mensagens foram divulgadas pelo jornal “Folha de S. Paulo” e, na época, Corona disse ter enviado o material ao grupo “para conhecimento”. O print foi anexado ao inquérito que tramita no Supremo Tribunal Federal como indício do suposto impulsionamento de ataques às instituições.
“Também há informações de que os empresários aqui investigados integrariam um grupo autodenominado de ‘Brasil 200 Empresarial’, em que os participantes colaboram entre si para impulsionar vídeos e materiais contendo ofensas e notícias falsas com o objetivo de desestabilizar as instituições democráticas e a independência dos poderes”, escreve Moraes no processo.
- Luciano Hang
Luciano Hang, dono da Havan, alvo de operação da PF contra fake news — Foto: Câmara dos Deputados
Luciano Hang é cofundador e dono da rede de lojas de departamento Havan. De acordo com o site oficial, a marca tem 145 lojas físicas em 17 estados, além do comércio virtual.
Aliado de Bolsonaro desde a campanha eleitoral de 2018, Hang chegou a ser processado pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) por afirmar, em um vídeo direcionado a funcionários, que demitiria equipes e fecharia lojas se “a esquerda” ganhasse a disputa presidencial.
O vídeo também levou o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) a condenar Hang por propaganda eleitoral irregular. O empresário não recorreu da punição – uma multa de R$ 2 mil.
Luciano Hang é, também, um crítico das medidas de isolamento e restrição de comércio durante a pandemia do novo coronavírus. Lojas da rede Havan já foram interditadas e multadas no Acre, em São Paulo e em Minas Gerais por descumprirem regras locais. Em defesa, a loja afirma que também funciona como hipermercado e, por isso, estaria abarcada na lista de serviços essenciais.
Em março, Hang publicou em redes sociais mensagens de convocação para os protestos marcados para o dia 15 do mesmo mês. Os atos incluíram demandas inconstitucionais e antidemocráticas, como o fechamento do Congresso e do Supremo.
“Brasileiros de todo o país estão confirmando presença nas manifestações desse domingo. Vamos fazer Brasília nos escutar. Na sua cidade vai ter manifestação? Mande aqui nos comentários o nome do seu município e onde vai ser a concentração. #dia15nasruas #dia15euvou”, postou, no dia 10 de março.
“Dia 15, todos os brasileiros devem estar nas ruas para a maior manifestação história. Conto com você”, disse, no dia 7 daquele mês.
- Otávio Oscar Fakhoury
Otávio Fakhoury, em imagem de 2016 — Foto: Arquivo pessoal
O empresário Otávio Fakhoury administra um fundo imobiliário próprio, além de empresas herdadas após a morte do pai. Em texto divulgado no ano passado, em resposta a uma reportagem da revista “Crusoé”, Fakhoury se definiu como membro e ex-membro de movimentos sociais como o “Vem Pra Rua” e o “Acorda Brasil”.
No texto, o empresário também disse colaborar desde 2016 com um “portal de notícias e análise política, com uma clara linha editorial conservadora”. Em 2018, Fakhoury doou mais de R$ 100 mil para campanhas eleitorais de candidatos do PSL.
O inquérito do STF que levou à operação da Polícia Federal cita Fakhoury como um dos empresários que, supostamente, ajuda a custear o impulsionamento de mensagens com fake news ou ameaças a autoridades. O documento não descreve condutas específicas de Fakhoury.
O empresário não mantém conta em redes sociais. O site financiado por Fakhoury criticou, no Twitter, o cumprimento dos mandados pela PF.
“Ministro Alexandre de Moraes do STF desfere ataque violento contra a liberdade de expressão e contra apoiadores do Presidente Bolsonaro”, diz o portal. Na mensagem anterior, o perfil chamava a Organização Mundial de Saúde de “organização criminosa chinesa”.
“Conforme o Crítica Nacional afirmou esta semana em nosso site e em nosso canal, o “estudo” publicado pela The Lancet sobre a HCQ [hidroxicloroquina] não passa de uma gigantesca fraude científica. Uma fraude endossada pela organização criminosa chinesa denominada Organização Mundial de Saúde”, afirma o site na rede social.
- Reynaldo Bianchi Junior
Rey Biannchi no Programa do Jô, em 2015 — Foto: Reprodução/TV Globo
Listado pelo STF com um dos financiadores do suposto esquema, Reynaldo se apresenta como o cantor e humorista Rey Biannchi.
No início do mês, Biannchi compartilhou entrevista dada ao site “Terça Livre” em que defende a dissolução do STF. O responsável pelo site, Allan dos Santos, também foi alvo dos mandados nesta quarta.
“Manifestação é bom no centro espírita, eu sou muito mais além. Eu acho que a gente tem que invadir a p… do STF, tirar aqueles caras na porrada. Falando sério. Eu não to aqui incitando violência, tô falando como Henry David Thoreau […] Com todo meu apoio ao governo Bolsonaro, às pautas de direita, conservadoras, falta-nos agressividade civil. Falta-nos invadir, mostrar pra esses filhos da p… aí, do STF, que quem manda nesta p… somos nós”, diz Biannchi.
“Sou a favor da dissolução do STF”, completa.
- Winston Rodrigues Lima
Winston Lima (de amarelo) durante manifestação na Esplanada dos Ministérios, em 2016 — Foto: Luiza Garonce/G1
Winston Rodrigues Lima é militar da reserva e, atualmente, participa de canais de vídeos e blogs de apoio a Bolsonaro.
Citado no inquérito como um dos possíveis financiadores do impulsionamento de fake news e ataques a autoridades, Winston costuma registrar, em vídeo, as conversas de Jair Bolsonaro com apoiadores na frente do Palácio da Alvorada, em Brasília.
Diferentemente da imprensa profissional, que fica restrita a uma área designada pelo Gabinete de Segurança Institucional (GSI) da Presidência da República, o militar da reserva é autorizado a circular entre apoiadores e a registrar as respostas de Bolsonaro a esse público – mesmo quando o presidente fala longe dos microfones posicionados por jornalistas.
O que diz o inquérito
No documento obtido pela TV Globo, Alexandre de Moraes não detalha as condutas dos cinco empresários apontados como financiadores do suposto esquema.
De acordo com o processo, os mandados de busca e apreensão têm como um dos objetivos, justamente, identificar como aconteciam as tratativas para o impulsionamento de mensagens e ameaças.
Trecho do inquérito com rede de seguidores do blogueiro Allan dos Santos — Foto: Reprodução/G1
“Essas tratativas ocorreriam em grupos fechados no aplicativo de mensagens whatsapp, permitido somente a seus integrantes. O acesso a essas informações é de vital importância para as investigações, notadamente para identificar, de maneira precisa, qual o alcance da atuação desses empresários nessa intrincada estrutura de disseminação de notícias fraudulentas”, diz Moraes.
Moraes aponta possível relação entre esses financiadores e o que vem sendo denominado de “Gabinete do Ódio”.
O termo foi popularizado por parlamentares que deixaram a base de apoio de Bolsonaro, como Joice Hasselmann (PSL-SP) e Alexandre Frota (DEM-RJ), e designa essa estrutura supostamente montada para espalhar informações falsas e difamações nas redes sociais.
“Some-se a esses fatos os depoimentos prestados pelos Deputados Federais Alexandre Frota e Joice Hasselmann em 17/12/2019, que narraram a existência de um grupo organizado conhecido por Gabinete do Ódio, dedicado a disseminação de notícias falsas e ataques a diversas pessoas e autoridades, dentre elas o Supremo Tribunal Federal. Todos esses investigados teriam ligação direta ou indiretamente com o aludido Gabinete do Ódio.”
“O material constante nos autos, notadamente os citados depoimentos e o relatório de fls. 6302-6353 apontam as pessoas físicas de Edgard Gomes Corona, Luciano Hang, Reynaldo Bianchi Junior e Winston Rodrigues Lima como possíveis responsáveis pelo financiamento de inúmeras publicações e vídeos com conteúdo difamante e ofensivo ao Supremo Tribunal Federal; bem como mensagens defendendo a subversão da ordem e incentivando a quebra da normalidade institucional e democrática”, afirma Moraes no inquérito.